sábado, 12 de janeiro de 2013

Metáfora


Aí um dia, a casa ficou velha demais. Paredes descascadas e trincadas, canos entupidos, mofo pelos cantos, piso encardido, janelas e portas emperradas, vidros trincados, lâmpadas queimadas, fiação à beira de um colapso. As opções: uma reforma superficial, só remendos; uma reforma mais profunda, mantendo as estruturas ou derrubar tudo e construir de novo. Pelo tamanho dos estragos, a terceira alternativa era a mais viável. Engenheiros, arquitetos, mestres de obras, pedreiros... todos concordavam.

Mas, todo o serviço teria de ser feito com os moradores ali. Eles não tinham para onde ir. A solução: desmanchar e refazer parte por parte. Viável e interessante, apesar de desgastante de desconfortável. Decisão tomada, hora de começar os trabalhos.
Derrubam as primeiras paredes. Poeira e escombros. Começam a erguer paredes novas. Tijolos e reboco. Tudo segue. Insalubre, mas com expectativas interessantes. Um dia, a tragédia. Caem as paredes velhas, todas de uma vez. E elas levam junto as novas que ainda não estavam totalmente prontas. Cai tudo. Só escombros. Só entulho. Só tristeza.

Sem ter para onde ir, o recurso é ficar. Juntar tijolos quebrados e ripas de madeira e improvisar uma barraca. Suja. Insalubre. Desconfortável. Não é uma casa. Não é sequer um abrigo. É provisório, até a casa nova ficar pronta. Não é fácil, mas é possível se acostumar a situações extremas assim. O problema é quando chove. A poeira vira barro. O abrigo vira alagadiço. O medo assola. O desconforto cresce. O desespero também. E a sensação de que aquilo nunca vai terminar. A casa nunca vai ficar pronta.

Aí, o sol volta. Mexe daqui, mexe dali e a barraca fica semi-habitável de novo. Apesar de tudo, o contentamento volta. A expectativa cresce. E a casa nova? Quantos quartos: um só ou vários, para receber amigos e família? E a sala: pequena e aconchegante, só pra ver TV ou espaçosa e confortável para receber muitos amigos? E a cozinha: superequipada com fogão grande, forno a lenha, para fazer comidinhas para batalhões ou funcional, só com um fogão básico e um microondas, para não precisar se preocupar em fazer comida. E o jardim: plantas medicinais, ornamentais ou venenosas para espantar os intrometidos?

E aí, mesclam-se os sonhos da casa novinha em folha, linda e perfeita com a realidade de viver entre escombros, sujo, mal-cheiroso, doentio. Chuva vai, chuva vem. Constrói, derruba, constrói de novo. Planeja, executa, repensa os planos, corrige. Será que um dia vai dar ser possível sair dos escombros da casa velha? Será que dá pra construir a casa nova sem usar parte desses escombros, já desgastados e cheios do ranço da casa velha? Será que um dia essa casa nova fica pronta? E como ela vai ser? Linda, perfeita ou assombrada e claustrofóbica como a velha? 

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